terça-feira, 2 de março de 2010

Pacote de Abril

– Apoiamos a mensagem ou vamos ter retrocesso político. Fiquei sabendo que será criada uma crise caso o MDB não vote favoravelmente à aprovação da Reforma do Judiciário, vindo aí um retrocesso institucional.

Essas foram as palavras do deputado Federal Tancredo Neves na reunião das bancadas do MDB, do Senado e da Câmara dos Deputados, no auditório Nereu Ramos, da Câmara Federal, sob a presidência de Ulysses Guimarães, presidente nacional do MDB.

Até então, sem nenhuma novidade aparente, as eleições para os governos estaduais seriam pelo sistema direto nas eleições de 1978.

As eleições de 1970 e 1974 haviam sido alteradas na última hora, por Emendas à Constituição, transformando-as em eleição indireta pelo Colégio Eleitoral de cada Estado.

Com exceção do Rio de Janeiro, a Arena tinha esmagadora maioria de votos nas Assembléias Legislativas, com o direito a eleger seu candidato, pois vivíamos sob o sistema do bipartidarismo. Os nomes dos governistas saiam de Brasília. A briga de bastidores era no Palácio do Planalto. Chegavam aos estados sem nenhuma condição de alteração. Por mais que houvesse atrito, os arenistas eram obrigados a sufragar o escolhido sem nenhuma contestação.

Finalmente estava chegando 1978 e com ele o pleito com a participação do povo, era o que estabelecia a Constituição Federal. Juarez Bernardes pleiteava a indicação do seu nome pelo MDB goiano, como integrante do grupo moderado, ou conservadores, e Henrique Santillo tinha o mesmo objetivo, só que pelos setores mais a esquerda. No mesmo pleito, o eleitor além de votar em deputados estaduais e federais, elegeria dois senadores.

Derval de Paiva e Fernando Cunha Jr, apoiavam a candidatura de Santillo ao governo. O grupo conservador, que apoiava a pretensão de Juarez Bernardes não possuía ainda seus pretensos candidatos ao Senado.

Em abril de 1977, o Presidente Geisel enviou mensagem implantando a Reforma do Judiciário para que fosse discutida, votada e aprovada pelo Congresso Nacional. A proposta era tão ruim, mas tão ruim, que Poder Judiciário, Ministério Público, OAB, cientistas e analistas jurídicos e advogados militantes se colocaram contra sua aprovação.

O MDB tinha que dar seu apoio à proposta para que fosse aprovada. A matéria dependia de quorum qualificado e a Arena não dispunha do quantitativo exigido.

Bancadas emedebistas na Câmara e no Senado se reuniram no auditório Nereu Ramos, na Câmara, para decidir qual posição adotar. Aprovar a reforma, como queria Geisel e seu núcleo forte no comando do governo, ou derrotá-la, como manifestava a nação

Ulysses Guimarães abriu espaço para que falassem um defensor pela aprovação e outro que fosse pela sua rejeição.

Tancredo Neves, homem de notável saber jurídico, mas que por saber o que estava por trás daquela proposta absurda e inconseqüente, tinha informações seguras do que pensavam os militares no poder, se apresentou para defender a aprovação da matéria, mesmo com restrições do mundo jurídico e imperfeições flagrantes existentes no texto.

Paulo Brossard, senador combativo e, da mesma forma que o deputado Tancredo, homem de grande saber jurídico, apelou para que o MDB votasse contra, rejeitando a matéria. Sua tese foi a de que o MDB não tinha o direito de compactuar com a ditadura, aprovando matéria que colocaria o Brasil de forma ridícula no cenário jurídico internacional.

Depois que o deputado mineiro viu seus argumentos jurídicos serem derrubados pelo Senador gaúcho, abriu o jogo:

– Apoiamos a mensagem ou vamos ter retrocesso político. Sei por fontes seguras que essa mensagem veio encomendada. Sendo rejeitada pelo MDB, vai dar o motivo que os militares querem para o retrocesso institucional.

Colocada em votação na reunião das bancadas, a maioria do MDB votou pela sua rejeição, conforme tese defendida por Brossard.

Fomos para o plenário e as bancadas votaram fechadas pela rejeição à Mensagem de Reforma do Judiciário. Todos seguiram a decisão da reunião de bancadas, no Senado e na Câmara dos Deputados, inclusive o deputado Tancredo Neves.

Anunciado o resultado pela direção dos trabalhos a matéria foi para o arquivo.

Em seguida foi baixado Ato do Executivo, assinado pelo presidente Ernesto Geisel, com base no Ato Institucional nº 5, colocando o Congresso Nacional em recesso, sem data certa para sua reabertura.

Aguardamos a “paulada” que deveria vir do Planalto, maior que a violência do fechamento do Congresso, sem demora.

Depois de uma semana fechado, o Congresso voltou a funcionar, com a edição do “pacote de abril”, sustentado pelo AI-5, acabando com eleição direta para governador do estado, suspendendo os programas políticos pela televisão e rádio nos moldes de 1974 e criando o Senador sem voto, Senador biônico, nomeado da mesma forma que os Governadores pelo Colégio Eleitoral do estado. Duro golpe nas pretensões emedebistas. Atraso na caminhada democrática.

O sonho de chegar parcialmente ao poder estava assim, mais uma vez, adiado.

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