terça-feira, 2 de março de 2010

Com a cara e com a coragem

– Zezinho, que história é essa de ser candidato?

Dona Maria, esposa do Zezinho, deixou a roupa no tanque, as panelas no fogão e foi atrás do marido para procurar saber direito daquela história de ser candidato.

Isto aconteceu em Niquelândia, para onde havíamos encaminhado o professor Lucas Gonçalves acompanhando Jovino Konder.

Foi numa época difícil, que mesmo com todo retrocesso e obstáculos políticos postos à nossa frente, a cassação de José Batista Jr. e a nomeação de prefeito em Anápolis, obtivemos uma grande vitória nas eleições gerais de 1974. Como candidato a Deputado Estadual, Henrique Santillo conseguiu 16 mil votos no município de Anápolis, enquanto que, como candidato a Deputado Federal, obtive 17 mil votos dos 48 mil ao todo recebido no estado.

Chegando o ano de 1976, apoiamos candidatos a prefeitos de vários municípios. No último instante permitido para a realização de convenção partidária, Jovino Konder procurou-nos demonstrando desejo de ser candidato a prefeito em Niquelândia, pelo MDB. Pediu-nos que alguém o levasse até aquela cidade para registrar a sua candidatura. Diante da sua insistência, solicitamos ao professor Lucas Gonçalves que o acompanhasse. Como Lucas não tinha prática de dirigir, Jovino Konder tomou o volante do Aero Willis que colocamos à sua disposição. Já no município de Niquelândia, povoado conhecido como Quebra Linha, Jovino estacionou o carro no acostamento da estrada determinando:

– Professor, dirija para mim, enquanto eu vou deitar no banco de trás, porque o povo de Niquelândia não pode me ver.

– Jovino, eu não sei dirigir.

– Você vai devagar, eu vou dando as orientações e ensinando como chegar até a mercearia do Manoel Dourado.

Assim foi feito. Lucas não passava dos 20 km por hora. Chegando à casa do Dourado, nosso líder Konder, após os cumprimentos formais, anunciou o desejo de inscrever-se como candidato a prefeito pelo MDB. Indagou se Manoel Dourado não gostaria de ser seu candidato a vice. Com a negativa, passou a discutir quem seria o vice ideal. Depois de analisarem vários nomes possíveis, não conseguiram encontrar alguém que pudesse, pelo menos, completar a chapa. Foi quando Jovino viu um cidadão bebendo a beira do balcão:

– Hei , amigo, você não gostaria de ser candidato a vice-prefeito na chapa do MDB?

– Eu?!? Disse o freguês ao mesmo tempo em que pedia mais uma dose.

– É, o senhor mesmo, todos nós precisamos participar da política!

– Quero sim!

Sem documento algum no bolso, pediu ao companheiro que com ele bebia que fosse até a sua casa buscar o título e a identidade, enquanto o professor Lucas secretariava a reunião, fazendo o rascunho da ata. Chegando à casa do futuro candidato a vice-prefeito pelo MDB, a esposa dele estava lavando roupa e cuidando das vasilhas para fazer o almoço:

– Dona Maria, o Zezinho mandou buscar o título de eleitor e a identidade dele que estão na gaveta da mesa da sala.

– Pra quê o Zezinho quer estes documentos agora?

– Ouvi dizer que ele vai ser vice-prefeito.

Dona Maria saiu nervosa ao encontro do marido na mercearia do Dourado. Chegando lá encontrou Zezinho recebendo aula do Jovino Konder de como discursar em público:

– Zezinho, pra quê esta falação se você só aprendeu a tirar leite. Que história é esta de ser candidato?

– ‘Péra aí Maria. O homem aqui é gente boa, me garantiu que com o salário que eu vou ganhar, logo a gente compra casa e automóvel!

– Nada disso, vamos pra casa, antes que alguém tenha de levar você carregado!

O vice, escolhido pelo Jovino era mesmo determinado, tinha tomado gosto pela candidatura e agora jogava tudo no seu futuro político. Não desistiu.

Lucas Gonçalves, secretariando a reunião, iniciou as anotações em livro próprio, com todos os dados e informações que precisava do Zezinho. Passou a anotar os documentos de Jovino Konder, começando pelo Título Eleitoral, a ser registrado em ata. Jovino, que, segundo o próprio, não poderia ser visto na cidade, solicitou ao Manoel Dourado que fosse ao cartório eleitoral buscar seu título que ali havia ficado. Logo depois Dourado retornou:

– Jovino, seu título é de Rio Maria, no Pará!

– Como? Eu pedi a transferência há muito tempo!

– É, mas você não pagou a multa e a transferência não foi realizada.

Lucas fechou o livro de atas e só restou sair da cidade, agora com mais prática no volante, com Jovino Konder deitado no banco de trás.

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