sábado, 27 de fevereiro de 2010

Visitas e imprevistos

Uma das cobranças que o eleitor mais faz é a presença do político.

Ainda que o seu trabalho legislativo ou executivo seja bem realizado, ainda que o seu desempenho no cargo atenda a expectativa do eleitor, a presença em sua casa, nos aniversários, encontros religiosos, culturais e esportivos é sempre notada como fator positivo da vida política.

Em campanhas eleitorais, os convites para reuniões são variados. Sempre procuramos atender os companheiros, independentemente do credo religioso confessado.

Em vários desses encontros aconteciam fatos interessantes. No momento traziam constrangimento, mas com o passar do tempo eram vistos com naturalidade.

Visita ao Mário

Foi assim numa visita ao Mario Santana, irmão do saudoso Bertolino Santana, que dirigia seu trabalho espiritual num terreiro localizado no Bairro São José. Convidados para uma festa de aniversário do terreiro, lá estávamos com o vereador Walmir Bastos Ribeiro.

Para iniciar a reunião, Mário encheu uma cuia, metade de uma pequena cabaça ou coité, com cachaça e o ritual era passar a vasilha de mão em mão entre os presentes. Cada um que a recebia tomava um gole e passava a cuia adiante.

Quando chegou a vez de Walmir Bastos, sem ter prestado atenção no ritual, bebeu todo o conteúdo. Constrangido, mas sem qualquer comentário, Mário encheu novamente a cuia e a cerimônia continuou.

Uns dez minutos depois, quebrando toda a solenidade que o ato exigia, Walmir Bastos suando bastante, voz arrastada, gritou:

– Já é hora da música, vamos dançar, gente, até o churrasco ficar pronto! Antes vamos aos discursos das autoridades.

Mário demorou um pouco para recobrar o controle da solenidade, mas terminou a reunião logo em seguida.

Visita ao Benício

Em outra oportunidade, com Onofre Quinan, Henrique Santillo e José Batista Jr., fomos a uma festa no Centro do Benício, localizado na Rua Mauá, onde havia seguidores e muitos visitantes. Ficamos sentados em roda, enquanto no centro do salão os números especiais eram apresentados pelos integrantes do ”Centro Espírita do Benício”.

Benício, com sua coroa de rei, sentado na cadeira mais elevada do recinto, gesticulava dizendo-nos alguma coisa que, no entanto, não era por nós compreendida. Interpretávamos seus gestos como sinal de satisfação pela quantidade de visitantes e alegria de todos.

Depois de tentar em vão comunicar-se conosco à distância, desceu do seu pedestal, passou a mão num enorme facão niquelado, parecido com uma grande adaga e caminhou em nossa direção. A sua atitude nos levou a pensar que era parte do ritual. Benício atravessou todo o salão e resoluto aproximou-se do local onde encontrávamos. Ao nos alcançar, parou e estático em frente a Onofre Quinan, que se encontrava com as pernas cruzadas, gritou:

– Descruzê! Descruzê! Descruzê!

Onofre só teve tempo de dar um pulo para trás, quase caindo da cadeira, enquanto a lâmina tocava o piso, levantando faísca.

Visita ao Raimundinho

Outro grande amigo nosso era o Raimundinho, responsável por trabalhos espirituais num pequeno salão comercial, ao lado de sua casa, no Bairro Boa Vista. Fomos visitá-lo em companhia de Inês, filha de Donana e Laurindo, companheiros políticos da região, com José Batista Jr. e Walmir Bastos. Ao chegarmos ficamos mais afastados, num canto do salão. Raimundinho atendia a um carregador de caminhão, homem forte, que estava bastante concentrado, totalmente trêmulo. Sem vaga ao nosso lado, o Walmir foi sentar-se no banco da frente, ao lado do homem em transe, que falava frases desconexas, resfolegando muito. O vereador olhou para trás em nossa direção e deu uma sonora gargalhada, quebrando totalmente a solenidade e a seriedade do ato. Raimundinho não perdeu a serenidade, mas o estivador virou-se de frente, aparentemente enfurecido, caindo de costas para o chão, dando um “bico” de pé direito por baixo do assento em que o vereador se encontrava. A força foi tamanha que levantou o Walmir alguns palmos para o ar, que caiu estatelado ao chão, mas levantou-se em seguida, apavorado, gritando:

– Valei-me senhor do Bonfim, valei-me senhor do Bonfim!

Não havia janela no recinto e a única porta existente havia sido trancada após nossa chegada. As luzes estavam apagadas e Walmir ficava tateando a parede. Só se acalmou quando a porta foi aberta e ele saltou para fora, saindo em desabalada carreira. Fomos encontrá-lo bem longe, suado, assustado, sem olhar para trás.

Visita ao pastor Jaconias

Homem de muita fé e fiel servo cristão era o senhor Jaconias Cavalcante, pai do ex-vereador José Escobar Cavalcante. Pastor da Igreja do Evangelho Quadrangular, dirigia os trabalhos de evangelização na igreja da Vila Santa Maria de Nazareth. Cidadão politizado, estava sempre atento aos acontecimentos políticos em Goiás e no Brasil. Gostava muito de política e do MDB, mas seu tempo era dedicado aos trabalhos da igreja.

Escobar, candidato a vereador, contou com o apoio decisivo do pastor Cavalcante, como era conhecido pelos irmãos. Num culto de quarta-feira, o pastor convidou Escobar para visitar a igreja, preparando os irmãos para o evento. No momento da apresentação, o pastor Cavalcante falou das virtudes do filho e de suas boas qualidades. Finalmente, disse que, embora o filho não comparecesse regularmente aos cultos, era um bom cristão. Com a palavra dada ao visitante, Escobar foi claro:

– Meus irmãos, tudo a respeito da minha vida foi dito pelo meu pai. Coloco a vida dele, amada por todos vocês em testemunho à minha própria vida. Gosto muito do trabalho que ele realiza pela evangelização dos perdidos e desesperados. Mas é meu dever dizer que me “amarro” mesmo é no espiritismo!

O pastor e a congregação, em estado de total espanto, deram a visita por encerrada, sem maiores comentários.

Visita do Anapolino

Anapolino de Faria, candidato a Deputado Federal, corria o interior do estado e eu, candidato a Deputado Estadual, fazia o trabalho em Anápolis com reuniões e visitas.

Naquela noite aconteceria uma reunião na Vila João Luiz de Oliveira, a qual Anapolino compareceria vindo de um encontro em Nerópolis.

Tudo estava acertado para uma boa reunião, quando um imprevisto ocorreu na tarde daquele dia. Aconteceu uma tragédia vitimando um rapaz vizinho da família que nos receberia e todos os moradores estavam abalados. Não havia clima para realização do encontro.

Fomos todos os companheiros prestar solidariedade à família enlutada. Solicitamos ao Zé Maneco, um dos organizadores do encontro, que ficasse no local para informar aos companheiros que chegassem o motivo da suspensão da reunião.

Por volta das nove da noite, sem saber do ocorrido, Anapolino de Faria chegou de Nerópolis estacionando seu automóvel em frente à multidão presente ao velório. Saiu do carro ao encontro de Zé Maneco que se deslocava para avisá-lo do acontecido.

Antes de ter tempo para pronunciar uma única palavra Zé Maneco ouviu a exclamação de Anapolino:

– Hei, Zé Maneco! Isso é que é liderança! Isso aqui não é reunião, isso já é comício.

E passou a cumprimentar efusivamente cada uma das pessoas até que foi puxado de lado pela camisa, quando Zé Maneco pode esclarecer tudo.

Direção perdida

Chefinho, o Sr. Messias Antônio Ribeiro, fazendeiro no Matão, nos seus últimos anos de vida passou a morar em Anápolis. Emedebista convicto, nos acompanhou em todas as disputas políticas de que participamos. Toda sua família sempre esteve ao nosso lado.

Chico Mineiro, um dos mais destacados lideres do MDB em Ouro Verde, antigo Matão, chefe de família numerosa e trabalhadora, era seu cunhado. Os filhos de Chico Mineiro além de numerosos sempre só lhe deram alegria pela correção de vida de todos eles.

Num domingo à tarde, três deles participavam de uma partida de sinuca, numa venda no Sapato Arcado, em frente à fazenda do Sr. Antônio Garcia, na estrada que liga Anápolis a Ouro Verde. Dois jovens que também participavam da partida se desentenderam com os filhos do Chico, terminando em troca de murros, pontapés e pauladas. Os rapazes do Chico Mineiro bateram mais que apanharam. Foram trazidos para Anápolis para fugirem de qualquer flagrante, sendo feita a queixa na polícia.

Em Anápolis, Zoroastro Vieira Braga, o Zuruca, Tonho Gaguinho e Chefinho foram até ao bairro JK, onde deixaram os rapazes.

Como eu e Vicente Alencar estávamos no interior do Estado, chegamos a Anápolis à noite e recebemos a informação pelo Romualdo que Chico Mineiro precisava falar conosco, urgentemente. Não sabíamos o endereço onde se encontravam no bairro JK. Fomos atrás do Zuruca, não o encontramos, havia saído. Partimos para o Mercado JK onde encontramos Tonho Gaguinho, bem embriagado:

– Tonho, os homens foram levados por vocês para onde?

– Homens? Que homens?

O recurso foi tirar o Chefinho do seu descanso

Vicente Alencar, Romualdo, Chefinho e eu rodamos umas quatro vezes todas as ruas do bairro JK e nada de encontrarmos a residência onde eles estavam. Chefinho dizia:

Suba para cá, vire para lá, passe para a esquerda, vira para a direita...

Não houve jeito. O recurso foi deixarmos para melhor oportunidade.

Vicente Alencar ainda sugeriu que retornássemos à Praça do Bom Jesus para que Chefinho se situasse melhor. Foi o que fizemos.

Quando chegamos à Praça do Bom Jesus, muito movimentada e lotada com o término da missa, fonte luminosa funcionando; já havíamos esquecido que Chefinho não conseguiria reconhecer o local onde à tarde ele, Zoroastro Vieira Braga e Tonho Gaguinho deixaram o compadre Chico. Chefinho que estava quieto, sem trocar uma só palavra em todo trajeto até a praça principal de Anápolis, indagou bastante preocupado:

– Que lugar é esse?

Ficou claro que tínhamos que deixar para o outro dia a procura por Chico naquelas ruas do Bairro JK, sem asfalto, tomadas pela poeira e sem iluminação pública.

Tecnologia avançada na cozinha

Em 1977, a eleição para o Senado teria sublegendas, dois candidatos do mesmo partido disputariam a vaga. Henrique não havia ainda se decidido, mas já era o candidato indicado para representar o grupo autêntico do MDB, enquanto que os conservadores indicaram Juarez Bernardes.

Visitei os diretórios das cidades que representava como Deputado Federal, trabalhando para a candidatura de Henrique. Em minhas viagens, levei Vicente de Paula Alencar, até aquele momento, defensor ferrenho da candidatura de Henrique Santillo.

Em Uruana, cidade a qual representava na Câmara Federal, fomos em primeiro lugar na casa do Sr. Agenor Moreira, ex-prefeito da cidade e grande líder emedebista. Lá estava também seu genro Custódio, que nos acompanhou às demais lideranças.

Quando deixamos a residência de José Gomes, partindo para a casa de outro companheiro, Custódio fez questão de nos mostrar a casa onde foi usada a primeira panela de pressão no Município. O autor da façanha foi um cerealista muito conceituado na cidade e que, pelo menos uma vez por semana, levava cereais para atacadistas anapolinos e, no retorno, levava as encomendas feitas pelos uruanenses.

Numa das suas idas e vindas a Anápolis, passou pela Casa Violeta, na Praça do Bom Jesus, quando assistiu a explanação de um vendedor da loja falando sobre a maior invenção do homem para a cozinha, a panela de pressão:

– Com esse aparelho, não há galinha, por mais velha de seja, que resista a temperatura.

Gostou do que viu e ouviu, comprando a panela para quatro litros. Logo toda população ficou sabendo que o “mais avançado instrumento da tecnologia moderna para uso na cozinha” havia chegado à cidade. Aproveitou para convidar compadres e amigos para domingo, após a missa das 9, irem à sua casa, porque enquanto os ‘truqueiros’ disputassem uma partida, um galo de mais de três anos seria cozido na panela de pressão.

Quando a disputa começou, a panela foi levada ao fogão a lenha estrategicamente instalado na cozinha. Antes mesmo que a primeira trucada acontecesse numa das mesas, a cozinheira, dona da casa, disse em voz alta ao chegar à porta:

– Gente a panela tá furada!

Surpresa geral. Os mais curiosos deixaram o jogo e foram à cozinha. Puderam ver e ouvir o barulho do vapor que saia pela válvula da panela. Decepcionado, o anfitrião já acertou para o domingo seguinte, no mesmo local e horário, a disputa do ‘truco’ e o uso da panela.

Segunda-feira bem cedo foi a uma oficina de conserto de utensílios domésticos, narrando o acontecido ao oficial, experiente no ramo. Não conhecia aquele instrumento, mas era visível que vazava no centro da tampa. Na mesma hora passou a mão no aparelho de solda a oxigênio, deu uma lixada na parte interna da tampa, reforçando o local da válvula com substanciosa camada de solda:

– Ela pode até vazar em outro lugar. Nesse nunca mais!

Domingo, horário combinado, lá estavam os ‘truqueiros’. Enquanto isso, para não decepcionar, os convidados o fogão foi aceso mais cedo, com angico bem sequinho.

Iniciada a partida pelos truqueiros na sala, o galo carijó, o mais antigo da região, foi dentro da panela, para o fogo.

– Truco... Truco...

– Seis milho, ladrão...

A algazarra e o barulho ensurdecedor só não conseguiram abafar o estrondo que veio da cozinha com a tampa da panela voando como um foguete, deixando estrago no telhado e pedaços do carijó presos as telhas.

VISITA A LEOPOLDO DE BULHÕES

Joaquim Roriz, candidato a deputado estadual e eu, candidato a reeleição de deputado federal, fizemos juntos várias visitas na região da estrada de ferro para que ele fosse apresentado aos companheiros de Pires do Rio, Vianópolis, Orizona e Leopoldo de Bulhões.

Para o encontro em Leopoldo de Bulhões cheguei acompanhado do advogado Vicente de Paula Alencar e o vereador Walmir Bastos Ribeiro, aguardando Joaquim Roriz na casa do presidente do MDB local, o amigo Agenor Gontijo.

Por volta das duas da tarde chovia fino deixando a rua tomada pelo lamaçal. Vicente Alencar calçava botina nova de solado sintético, garantindo ser a última novidade contra derrapagens. Apressou-se a atravessar a lama da rua para alcançar a porta de entrada da casa de Agenor, bem escorregadia pelo lodo formado por alguns dias de chuva permanente. Firmou o pé direito na ponta da calçada escorregadia e imediatamente deu uma deslizada levando um tombo que o deixou sentado no chão:

- Não dá para a gente acreditar em mais nada! Me disseram que a botina fixava em pista escorregadia como um ímã.

Vicente precisou de toalhas e algum tempo para limpar-se. Quando Roriz chegou, com Vicente já recuperado, continuamos nosso roteiro nos dirigindo a outra cidade da região.

Foi uma reunião de liderança na qual apresentei Joaquim Roriz que até então era conhecido como Joaquim Domingos, falando das suas qualidades pessoais e políticas. Estavam todos ao par do apoio de Luziânia à candidatura do Henrique ao Senado. Outra vantagem em apoiar Joaquim, era o fato dele ser da região, o que garantia sua presença para ajudar os companheiros, o que foi ratificado na fala do próprio. Em nome do diretório falou o tesoureiro:

- Dr. Joaquim Domingos, nós aqui sempre apoiamos os irmãos Santillo...

- Vocês vão continuar apoiando os irmãos Santillo, atalhou Roriz, nós de Luziânia agora estamos juntos com eles, também...

- Pois é, Doutor Joaquim, sempre estivemos com eles porque nunca nos faltaram com apoio e também pelo nosso amor ao MDB. Mas nunca pedimos um cruzeiro para eles, sempre os apoiamos de forma relevante, de graça.

- Muito bem!. Parabéns pela luta de vocês! ressaltou Roriz.

- É, mas agora a gente vai precisar de um dinheirinho....

- Para que que vocês precisam de dinheirinho? brincou Roriz.

- Prá fazer uma campanha com mais conforto.

Walmir Bastos que parecia estar cochilando num canto da sala, soltou sua tradicional gargalhada, sonora e inconfundível, levando todos a rirem também. Walmir, grande amigo de Roriz, a partir daquele momento todas as vêzes que se referia a Roriz, dizia:

- Joaquim conforto...

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