sábado, 27 de fevereiro de 2010

Pingue-pongue da verdade

– Que irmãos coragem que nada! Eles são mesmo irmãos metralha!

A intenção de nossos adversários políticos era evitar a comparação positiva dos irmãos Santillo, Henrique, Romualdo e eu, com os irmãos carismáticos da novela da Globo, “Irmãos Coragem”. Queriam nos comparar com os “irmãos do mal”, dos quadrinhos de Walt Disney.

O fato é que até mesmo a crítica de nossos adversários, com intuito de nos ridicularizar, foi carinhosamente assimilada e adotada pelos nossos admiradores como ação positiva dos irmãos que “metralhavam” a ditadura e suas mazelas.

A campanha eleitoral de 1974 foi a mais aberta de todas no período do Regime Militar. O General Ernesto Geisel, escolhido Presidente da República, em substituição ao general Emilio Garrastazu Médici, estava disposto a promover a abertura “lenta e gradual” no sistema político brasileiro. A principal novidade naquela campanha eleitoral foi o direito dos candidatos dos dois partidos existentes, Arena e MDB, de usarem em tempo proporcionalmente igual, o horário de rádio e tevê, para propaganda eleitoral gratuita. Com essa inovação na campanha eleitoral, ficou evidente a divergência entre os grupos do Presidente Geisel e do ex-Presidente Médici.

Administrando com mão de ferro, o Presidente Médici passou uma imagem ao cidadão comum, menos informado, de estadista e grande governante. A conquista do tricampeonato mundial de futebol pela equipe brasileira, aliada à forte censura à imprensa, provocou aniquilamento das forças oposicionistas e dos movimentos populares. Foi a época do “Brasil, ame-o ou deixe-o”, impingindo à nação uma euforia nacionalista.

O grupo do Presidente Geisel reconhecia os mais elementares desrespeitos à pessoa humana, praticados pelo governo antecessor, nas Delegacias de Ordem Política Social, DOPS, nos Estados, DOI-CODI, em nível nacional, Operação Bandeirantes, que era praticamente um esquadrão da morte, eliminando presos comuns e políticos e outras arbitrariedades. Para encobrir esta situação de arbítrio, de torturas e assassinatos oficiais, o governo alardeava um falso crescimento econômico através do chamado “milagre brasileiro”.

No início do Governo Geisel a crise do petróleo desmontou a farsa do milagre brasileiro, mergulhando o país numa das suas maiores crises econômicas de todos os tempos. Era preciso desmistificar a ilusão imposta à população da imagem de estadista do Presidente Médici. Geisel estava disposto a isto e abriu espaço para a oposição durante a campanha eleitoral de 1974.

– Henrique, vamos fazer o programa eleitoral juntos, você pergunta eu respondo, depois eu pergunto e você responde. Vamos fazer um pingue-pongue!

– Isso mesmo Adhemar, vamos colocar este nome: “Pingue-pongue da Verdade!”

Nesse clima fizemos ao vivo nossa participação pelo rádio e pela TV.

Como candidato a Deputado Estadual, Henrique tinha seu espaço, o mesmo acontecia comigo, na qualidade de candidato a Deputado Federal. Resolvemos somar nossos horários gratuitos na TV, fazendo apresentação em conjunto, o que nos dava um tempo maior.

O “Pingue-pongue da Verdade” logo se tornou um sucesso devido ao interesse da população em saber o que realmente acontecia no Brasil. Por ser um programa contundente e corajoso, o horário do MDB era imbatível em audiência. Habituado a ouvir apenas as informações oficiais liberadas pela censura, para o telespectador as verdades oposicionistas, mesmo que tímidas e limitadas, chegaram como esperança para mudanças. Henrique e eu já tínhamos grande entrosamento na apresentação do nosso programa de rádio “O povo falou, tá falado”, o que facilitou nossa apresentação ao vivo, pela TV. Por todos os locais onde passávamos as pessoas nos cumprimentavam pelo “Pingue-pongue da Verdade”.

Éramos conhecidos por todo o Estado como os “Irmãos Coragem”, à semelhança dos protagonistas da novela das 20 horas da televisão Globo. Até mesmo a crítica de nossos adversários, com intuito de nos ridicularizar taxando-nos de “irmãos metralha”, foi carinhosamente assimilada e adotada pelos espectadores como ação positiva de uma dupla que “metralhava” a ditadura e suas mazelas.

O MDB usou com competência e sabedoria seu espaço no rádio e na televisão durante esta abertura dada por Geisel, em 1974, e o resultado foi visto em todo o Brasil. O MDB elegeu 16 senadores, algumas centenas de Deputados Estaduais e quase uma centena de Deputados Federais.

Devido a esta abertura que o Governo Geisel foi forçado a promover, o Brasil foi despertado em todos os seus quadrantes e o regime autoritário a partir de 1974, em virtude da força da oposição, começou a enfraquecer. Por mais que viessem casuísmos, restrições e fechamentos antidemocráticos, as forças populares forçaram o declínio da opressão ditatorial, até o retorno da democracia no país.

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